Parte 6: O Real Valor se muda para São Paulo
Eduardo BelottiSCARFMembro ExperienteEngaja y Engaja
Publicado há 260 dias • Editado há 209 dias

Parte 6: O Real Valor se muda para São Paulo

Po… vou abrir um negócio aqui com você. Agora eu entendo o que é “writer’s block”.

Essa parte está sendo dolorosa de escrever. Ainda mais que eu mesmo me coloquei essa pressão de postar toda quarta as 11:00.

Venho procrastinando e simplesmente não consigo começar a escrever esse texto. São 7:14. Preciso postar as 11:00 e simplesmente não consigo começar. Tô aqui vendo as fotos da época para pegar inspiração para escrever, mas está difícil.

Desculpe pelo devaneio. Vamos ao texto.

Assinamos o contrato com a ACE e a aceleração começaria dali a algumas semanas. Tempo para convencer um grande amigo de me deixar ficar na casa dele até eu achar um lugar pra ficar.

A mentalidade estava clara:

Gastar o mínimo de dinheiro possível para estender runway da empresa. Trabalhar o máximo para conseguir extrair o melhor que a aceleração poderia entregar.

O objetivo era passar do ACE Start para o ACE Growth e receber os 150k de investimento. Esse dinheiro seria game changer para a empresa.

Primeira semana na ACE

Em outubro de 2017 fomos para São Paulo.

A primeira semana da ACE era chamada de Wizard e era focada em palestras e dinâmicas para colocar todas as aceleradas na mesma página. O objetivo também era de fazer as empresas se entrosarem um pouco.

Os primeiros dias foram no escritório do Google na Faria Lima.

Dizem que só se tem uma oportunidade de deixar uma boa primeira impressão.

A Ace executou isso com perfeição.

Eu era um empreendedor que estava desenvolvendo um app na base da força bruta e na força de vontade. Sem o glamour de Venture Capital - o dinheiro era próprio. Sem escritório - a gente usava a biblioteca da Puc. Sem founders de sucesso conhecidos - meus mentores eram os livros.

E do nada eu estava num escritório INSANO ouvindo palestras de gente foda sobre assuntos que eu nem conhecia, mas que tinham aplicações imediatas no Real Valor, como jobs to be done pessoais e sociais.

Eu e Gabriel debatendo ideias depois de uma de várias palestras.

Não tem muito jeito de passar para você como é o escritório do Google em São Paulo. Fotos e vídeos não entregam a sensação de abrir uma gaveta e ter kinder Bueno a vontade. Abrir outra e ter barrinha de cereal. Ter frutas, local de descompressão e por aí vai.

Pra fechar com chave de ouro, a ACE tinha organizado uma visita a ao Hopi Hari no final de semana para todas as aceleradas. Seria um dia de lazer para entrosar ainda mais as empresas.

Po. Eu me amaaaaarro em montanha russa. Estava animado.

Mas a única montanha russa que eu embarcaria seria a montanha russa de emoções.

Na sexta feira eu recebo uma ligação da minha mãe.

Nosso cachorro estava com algum problema que impedia ele de se deitar. Ele gritava de dor toda vez que tentava e tinha passado um dia sem dormir. Como minha mãe e meu pai estavam viajando, eles precisavam que eu fosse pro RJ para dar um suporte para quem estava cuidando dele.

Comprei uma passagem de ônibus às pressas e fui para o RJ ajudar o toró.

Não vou me estender no assunto do que que era porque esse não é o objetivo da sequência de textos, mas sempre que posso, trago esses eventos da vida real que fizeram os planos serem alterados. Mas não se preocupe. Ele ficou bem depois de algumas injeções e depois operou para resolver o problema.

Esses meus textos parecem até um filme de comédia em que sempre o personagem principal está prestes a conseguir o que ele quer, mas sempre tem um contratempo para atrapalhar. É a dura vida real.

É um eterno “recalculando a rota” do Waze.

Queria ter ido no parque de diversões com a rapaziada, mas não deu. Entre ir ao parque de diversões ou ajudar o toró, vou escolher o segundo 100% das vezes.

Torózinho na época, com dificuldade de se deitar

Dia a dia no Ace Start

Na semana seguinte, começou a aceleração de fato.

Nosso escritório passou a ser esse. Ao lado de várias startups.

Agora temos um acelerador

Fomos designados um acelerador. O Sullivan Santiago.

O objetivo dele era basicamente passar um pouco de metodologia do que deveríamos estar fazendo

para conseguir chegar no Product Market Fit o mais rápido possível e gastando o mínimo de dinheiro.

Ele também tinha como objetivo “esticar a corda” o máximo possível sem romper. Ele mesmo falou isso. Isso significa nos levar ao limite.

E isso pode ser visto ao longo da aceleração.

Ele era um mix de mentor e carrasco.

Ele tirava dúvidas importantes de modelo de negócios, metodologia e outros problemas que founders costumam ter.

Mas ele também dava umas patadas completamente descabidas.

Lembro de fazer uma pergunta e receber uma resposta do tipo “Um bom founder não faz esse tipo de pergunta para mim. Descobre você, ué”.

Eu fiquei MUITO puto. Você não tem ideia. Na verdade, talvez tenha. Você já leu nos textos anteriores o quão explosivo eu sou as vezes.

Eu fiquei MALUCO.

“Que filho da puta… O objetivo dele não é ajudar a gente? Por que esse porra fala assim do nada?”

Hoje eu vejo que aquilo na verdade era um personagem. Imagino que o objetivo era “criar casca”.

Hoje agradeço por isso. (Mas na hora eu ficava LOUCO).

A dinâmica

A gente tinha 1 reunião por semana com nosso acelerador. Ele passava alguns deveres de casa para a gente fazer. Nossa semana era trabalhar no desenvolvimento do app e fazer esses deveres de casa.

O primeiro foi entrevistar a nossa persona para pegar feedbacks. Lembra que eu já tinha feito isso lá no começo do Real Valor? Não importava. Precisava refazer e documentar tudo.

“Suli, quando eu sei que é a hora de parar de entrevistar?”

“Vai chegar um momento em que você já vai saber as respostas que o cara vai dar antes mesmo dele falar. Esse é o momento que você já está conhecendo a sua persona bem o suficiente”.

Meio mestre dos magos ne?

As tarefas eram desse tipo.

  • Entrevistas usuários

  • Traçar nosso ICP (Ideal Customer Profile)

  • Definir Jobs to be Done funcionais, pessoais e sociais

  • Traçar um plano de aquisição de usuários

E por aí vai.

Exemplo de uma dessas tarefas. Nessa, a gente teve que descobrir o que os usuários queriam com o Real Valor.

Uma vez por mês a gente fazia uma apresentação do que a gente tinha progredido e para onde a empresa estava indo.

Essa dinâmica foi MUITO do caralho para a gente.

Tudo isso se passava num coworking lotado de startups ACE. Inclusive com startups que passaram por turmas anteriores e já estavam em estágio mais avançado.

Essa vivência com as outras startups foi game changer.

Sabe aquela história de que você é a média das 5 pessoas mais próximas? Nessa época, as 20 pessoas mais próximas estavam com objetivos parecidos: fazer sua startup crescer. Isso moldou a minha vida como empreendedor.

A gente vivia o Real Valor 24h por dia.

Mais um dia sendo os últimos a irem embora do escritório

Como diria o Metallica, “Full speed or nothing”.

Show me the money

A ACE sempre trazia a visão de que a gente precisava fazer dinheiro no Real Valor.

O fato de a gente ter centenas de usuários não os convencia de que estávamos no caminho certo.

É como dar brigadeiro de graça para os outros. As pessoas vão comer e gostar.

Mas você só sabe se esses brigadeiros são bons mesmo quando você bota um preço neles e as pessoas começam a pagar.

A gente precisava cobrar pelo Real Valor.

Registro da marca

Um detalhe interessante aconteceu nessa época.

Em meados de 2017, o Real Valor se tornou um CNPJ. Pouco tempo depois, a gente registrou o nosso logo no INPI. Isso é um procedimento padrão assegurar que você é o dono daquela marca em questão.

Registramos as 3 marcas.

  • Nominativa: “Real Valor” com a fonte certa e as cores

  • Figurativa: a arara dentro do ninho/gráfico donut

  • Mista: a arara e o “Real Valor”

Mas o processo é burocrático e lento. Eu já nem lembro com detalhes como funciona, mas desde o momento que você dá entrada na marca até o momento que ela de fato passa a ser sua, é um bom tempo.

Em um dado momento, recebemos um email dizendo que o Valor Econômico tinha entrado com alguma medida para evitar que a gente conseguisse registrar “Real Valor”.

A alegação era de que a gente estava usando o nome “Valor” num segmento parecido com o deles (economia/investimentos) com o intuito de ludibriar os leitores. Como se a gente quisesse pegar carona na fama do valor econômico.

Quando eu e Gabriel recebemos isso, a gente nem sabia direito o que pensar.

TV gif. We zoom in slightly on Steve Harvey who is profoundly puzzled by what he's just heard.

Levamos para a ACE e para o nosso amigo/mentor Patrick que apesar daquele momento ser um empreendedor full time, tinha trabalhado com marcas e patentes anteriormente (ele tinha nos ajudado a dar entrada na marca).

A ACE foi bem straightforward: “Muda o nome/logo… a porra toda. Vocês ainda não têm a marca conhecida. É melhor mudar agora do que levar esse caso adiante. Caso o juiz dê ganho para o Valor e vocês já tenham uma base de usuários estabelecida, vai ser uma dor de cabeça grande mudar o nome.”

Eles contaram um caso de alguma investida deles que teve o mesmo problema. Eles optaram por manter e esperar a decisão do juiz. Acabaram perdendo.

O Patrick ponderou os dois lados: “Vocês podem mudar o nome e deixar esse problema de lado, mas vocês também podem manter e ir “pro pau”. O que vocês fazem é bem diferente do que eles fazem. Eles não podem se sentir no direito de “patentear” a palavra “Valor”. Acho descabido o que estão fazendo e acho que não tem como vocês perderem isso.”

E agora?

Não basta estar com 2 grandes problemas na cabeça como monetizar a plataforma e fazer a versão iOS.

Do NADA, o VALOR ECONOMICO tá querendo brigar com a gente.

A saída da ACE era mais segura, mas porra… O processo de criação foi muito foda. Não queria abrir mão daquilo.

A saída do Patrick era mais arriscada. Existiam incertezas. Mesmo ele falando que a gente provavelmente não perderia a marca, um juiz poderia dar ganho para eles mesmo assim.

A verdade é que a nossa decisão não foi beeeem uma decisão igual aquelas de filme, em que os dois sócios conversam até que um soca a mesa e diz “VAMOS PRA CIMA. VAMOS MANTER. SOMOS O REAL VALOR E NINGUÉM VAI MUDAR ISSO”.

Na verdade, a gente estava completamente overwhelmed com tudo. A gente estava lutando muitas batalhas ao mesmo tempo.

Decidimos manter a marca e ir adiante.

A gente preferiu empurrar esse problema para frente e atacar os problemas mais importantes e urgentes, como monetização.

A gente só queria esquecer isso e torcer pro juiz dar ganho de causa para a gente. Mas como esse tramite todo demoraria por volta de 1 ano, FODA-SE.

Problema para o Eduardo e o Gabriel de daqui a 1 ano.

Vamos focar no que a gente precisa fazer agora para manter a empresa viva e saudável. Vamos monetizar o Real Valor.

O caminho para o premium

Deixa-me confessar uma coisa:

Eu venho omitindo algumas informações.

Algumas, de propósito para o texto não ficar gigante. Outras simplesmente porque não lembro mesmo (o que provavelmente significa que não foi tão marcante para mim na época).

Uma dessas informações omitidas é sobre o premium.

Desde o nosso lançamento beta, a gente criou uma waitlist para o premium. A gente comunicava no próprio app que lançaríamos um plano premium, com melhores funcionalidades e as pessoas que estivessem nessa lista de espera teriam descontos.

Ao longo do tempo as pessoas iam demonstrando interesse mesmo sem saber ao certo o que seria o premium.

E a gente ia aproveitando para ter tempo para pensar o que seria aquele plano premium de fato.

Mas a hora tinha chegado.

A gente já tinha 10 meses de Real Valor. A gente tinha acabado de bater a marca de 1000 downloads. A gente tinha usuários que amavam o app. Feedbacks de todos os lados. A gente estava na ACE.

Real Valor com 1004 downloads.

E agora já não era o só o peso da nossa própria consciência falando: pare de brincar de startup e comece a monetizar a plataforma.

Agora a ACE estava verbalizando isso.

Eu e Gabriel passamos alguns dias pensando qual seria o formato desse premium.

No fim chegamos à conclusão de que iríamos limitar o número de ativos para o plano free. Além disso, toda e qualquer nova funcionalidade seria focada para o premium.

Sendo honesto contigo, eu já nem lembro direito se tinham outras funcionalidades ou não…, mas isso pouco importa agora.

Um dos nossos brainstorms do que deveria ir para o premium ou não

A gente precisava colocar esse negócio na rua. A gente estava pressionado.

O gateway de pagamento

Para cobrar por um plano premium, é necessário ter um gateway de pagamento e uma subadquirente atrelado ao app. Traduzindo para português claro, a gente precisava colocar o equivalente a uma maquininha de cartão no app.

Sabe quando você coloca os dados do seu cartão num e-commerce da vida?

A gente precisava disso.

A Playstore do Google fornece essa solução e obriga os apps a usarem ela (tirando algumas exceções)

A solução deles era bem boa. E a política do Google obrigava a gente a usá-la.

Maaaaaas o Google cobrava 30% de cada transação.

“30%!? Isso é um assalto. Vamos usar outro gateway po”

Nope Scared GIF - Nope Scared Im Out GIFs

Esse foi o nosso pensamento. E verdade seja dita: é o pensamento de todo app grande.

Se não me engano, o Fortnite entrou numa briga com a Apple por causa disso. (Apple também cobrava 30%).

Outros apps acabam driblando essa obrigação ao direcionar o usuário para o seu site e cobrar a assinatura por lá.

É o caso de sites de streaming, por exemplo.

Não sei como é hoje, mas naquela época, se você clicasse para assinar o Netflix dentro do app, você era jogado para fora do app, para o site deles, onde você tinha que fazer o login mais uma vez e depois colocar os dados.

É uma experiência MUITO pior. Mas o Netflix (e várias outras empresas) achavam que o payoff era valido.

Esse tipo de estratégia funciona quando a sua marca é muito forte e sua receita de assinatura é grande demais a ponto de 30% de custos não ser tolerável.

Não era o nosso caso, mas a gente também não sabia disso tudo que eu estou te falando agora.

A gente decidiu lutar contra essa injustiça e fazer o modelo do Netflix.

Olhando para trás, foi uma ideia RUIM PARA CARARALHO. E como a grande maioria das ideias OUSADAS e RUINS que a gente teve, a ideia foi minha e não do Gabriel.

Fazer com um gateway externo é muito mais complexo e a gente não tinha a menor ideia de como fazer.

Mas aí entra o Gn2 que eu falei há alguns textos atras.

Lá a gente conheceu o Joao, que trabalhava no gateway de pagamentos da Stone na época (Mundipagg).

E lá a gente conheceu o Thiago Ferolla que apesar de estar cursando engenharia de produção, era um aficionado por programação.

Conversamos com o Joao e fechamos com a Mundipagg.

Conversamos com o Ferolla e fechamos um contrato de freelance. Ele conectaria o gateway ao Real Valor em roca de 700 reais.

Um call com o Thiago quando ainda não existia Google Meet, Teams nem Zoom

A iniciativa de monetização tinha demorado 10 meses para ser iniciada, mas estava começando a sair do papel bem rápido.

Próximos capítulos

Comecei esse texto falando que os dois objetivos eram “Gastar o mínimo de dinheiro possível para estender runway da empresa. Trabalhar o máximo para conseguir extrair o melhor que a aceleração poderia entregar.”

Acabei abordando a parte de “trabalhar o máximo possível” e não consegui falar um pouco sobre o lado pessoal de gastar o mínimo de dinheiro possível. Vai ficar para o próximo texto.

Vou falar sobre a continuação da saga da monetização e dos desafios pessoais de morar em SP gastando o mínimo possível.

Obrigado por ter lido até aqui e até quarta feira que vem.

10